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Texto retirado de: O Arcano da Dama de espadas

Na penumbra de um quarto de meretriz entre o vinho e o fado, Adelaide da Facada, quinté parece uma Severa, e o tocador, o Amâncio cantam a sua tristeza sonhando."
Um dos quadros com maior impacto de José Malhoa será, sem dúvida, O Fado, que retrata personagens lisboetas numa cena urbana, num ambiente de interior, donde o sol, figura emblemática da sua pintura, desta vez se ausentou.
O fadista, Malhoa encontrou - o na Tendinha do Rossio. Fora - lhe indicado por uma prostituta da Rua do Capelão, na Mouraria. Tocava guitarra e "manejava e navalhava como poucos". Era ciumento e brigão. Foi Amâncio, assim se chamava, que apresentou ao pintor o outro modelo, a Adelaide. Era conhecida como "Adelaide da Facada", devido a um golpe profundo na face esquerda. Tinha um gato "cego de um olho e mau", o Escamado, mas que não foi possível obrigar à pose. A Adelaide recusou entrar no atelier de Malhoa, "temendo ir assistir a alguma cena menos decente".
Contratados a 6 vinténs por semana, as faltas eram, no entanto, frequentes. Durante essa semana várias foram as exigências marialvas de Amâncio e as descidas de alça da camisa que Adelaide ostenta no quadro.
"O Amâncio roído de ciúmes, agredia a companheira, logo que o pintor voltava as costas. Vinha a polícia e lá iam os dois para o Governo Cívil a insultarem - se mutuamente, até que o mestre Malhoa, com a sua influência pessoal, conseguia libertar os turbulentos modelos".
"Evocação de vício e de paixão, de abandono e de ardor amoroso, de relaxamento e de cantares, o tema não prima, nem pela beleza, nem pela moral".

Comentários

  1. Saudações e felicitações pelo blog! E também uma pergunta: alguém sabe o título do fado que Dina Tereza canta no filme "A Severa" e que diz "O meu corpo é todo teu/Mesmo partido em pedaços" e "eu, mesmo morta, te beijo"?

    Desde já agradeço resposta! Um e-abraço.

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